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sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Ilha das Flores (Jorge Furtado)

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Esse menino estrangeiro


Praia da Barra (Morro do Cristo)



Queridas Aichlee, Amy, Lisa, Paola,

Queridas e queridos visitantes deste blog,

Pela primeira vez participei de um projeto de blog para um curso de português para estrangeiros, sem escrever, sem me manifestar no suporte, o blog. Naturalmente, as meninas autoras deste acontecimento multimidiático de trocas interculturais em português variedade brasileira estiveram em diálogo comigo durante todo o processo. Em geral, os textos antes de chegarem aqui passaram por pelo menos uma reescrita, após indicações de correção e comentários sobre forma e conteúdo, sobre possíveis respostas suscitadas pelos textos, sobre as intenções, as práticas, os contextos relacionados aos discursos.

Foi um semestre intenso, hem? Não sei para vocês, mas para mim, nossa! Foram quatro meses de idas e vindas. Karin, uma das autoras do gringos tagarelas começou com a gente, mas por causa dos horários da Universidade Católica, teve que ir para as aulas da queridíssima Tânia. Ina estava muito interessada e entusiasmada, mas teve que ficar com as aulas de Fotografia do também querido Edgard Oliva. Perdi dois alunos para dois professores amigos. Logo, não perdi, eles, alunas e professores, é que ganharam. Ganhei quatro meninas estrangeiras. Foram elas que se nomearam assim. Ou pelo menos foi Lisa que deu o nome e todos, inclusive eu, aceitamos.

Demorei muito para escrever por muitos motivos. Além de todas as minhas atribuições de professor em final de ano, neste eu resolvi me inscrever para o Mestrado em Letras da UFBA com um projeto para a área de Ensino de Língua Estrangeira. Como eu já tinha cursado um outro Mestrado, só que em Teoria da Literatura, não podia fazer feio. Passei e agora vou continuar (não começar) minha pesquisa sobre blogs como ferramenta de ensino-aprendizagem de Português como Língua Estrangeira. Acredito que um blog neste caso é muito mais que uma alternativa de material didático, mas um lugar de interação real, de práticas discursivas significativas para o professor e os aprendizes e, mais importante, um ambiente virtual em que os papéis de professor e aprendiz são ressignificados.

Além da seleção pro Mestrado e das turmas de brasileiros e estrangeiros que tinha que concluir, participei do X Seminário de Lingüística Aplicada, coordenando uma Sessão Temática http://www.sla.letras.ufba.br/programacao_mais.htm#1012com na qual apresentei um trabalho sobre este blog e algumas trocas interculturais observadas entre as autoras e os brasileiros que deixaram alguns comentários. Vou falar muito brevemente do que tratei nesta comunicação, que deve ser publicada nos Anais do evento citado.

Nesta pesquisa, pretendo demonstrar, com base em uma experiência de mais de um ano e três blogs, como este suporte/ambiente virtual pode servir de espaço de aprendizagem significativa não só para os “estrangeiros”, mas para os brasileiros, o que inclui o professor. Longe de uma retórica vazia adepta de certos modismos pedagógicos, venho observando que à medida que vamos praticando a escrita regular, socialmente motivada porque com leitoras e leitores reais, os temas vão surgindo não por imposição do professor ou do plano, mas da necessidade de compreender o Brasil, os brasileiros e as brasileiras e a própria cultura de origem de quem escreve.

Partindo de um conceito de ALMEIDA FILHO, o de desestrangeirização, fui com o tempo observando que quem mais vai modificando a percepção da língua-cultura do Brasil sou eu. Modifico porque as perguntas que me são feitas me fazem olhar a minha língua-cultura como quem vê de fora, como quem está também aprendendo. Problematizando o lugar de estrangeiro, problematizo o meu lugar de nativo e de professor. Aprendi com Paola, Amy, Aichlee e Lisa (neste semestre, além dos outros estudantes, brasileiros e estrangeiros) em quatro meses o que Paulo Freire, Homi Babha, Said Ali, Fantz Fanon, Michel Foucault vêm duramente tentando me ensinar há alguns anos: desacreditar dos estereótipos, das verdades inquestionáveis, das trocas desinteressadas, dos saberes higienizados, das respostas fáceis.

Foi movido por este espírito questionador e problematizador que pela terceira vez propus um blog a uma turma de estudantes estrangeiras. E elas toparam. Jamais pensando nelas como cobaias de uma experiência de laboratório virtual, mas partindo da crença de que temos nessas “meninas estrangeiras”, como vocês bem podem ver nestes textos aqui publicados, autoras também em português brasileiro, dotadas de voz e vontade, sujeitos de uma história que se vai escrevendo e que não acaba nunca, como eu gostaria muito que nunca acabasse esse blog.

Aguardo vocês, meninas estrangeiras, com seus comentários, e vocês leitoras e leitoras deste blog. Foram mais de 500 pessoas nos 5 continentes (o "whos amung us" deu pane, infelizmente! mas passou muito mais gente do que o mapinha do lado está mostrando agora). Aguardo novos textos das verdadeiras autoras deste projeto. Conto com a ajuda de todas e todos para minha pesquisa de mestrado, que não pretende revolucionar o mundo, mas que quer contribuir com a sistematização de uma metodologia que vem dando certo, como Aichlee de forma tão generosa testemunhou no texto abaixo. Volto em breve.

Feliz 2009!

Salvador, segundo a minha varanda (minha até março de 2009!)



terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Minha despedida

Como eu só tenho duas semanas e alguns dias até eu voltar aos EUA, eu já estou sentindo saudades. Minhas aulas já acabaram e agora a única coisa que eu tenho para fazer é pensar em cada coisa de que eu vou sentir a falta depois de ir embora. Mas esses dias eu estou sentindo bem mais alerta e observante. Pode ser porque eu sou de ferias, mas eu penso que é porque eu não quero perder as detalhes dessas últimas semanas aqui no Brasil. Agora eu quero ser uma esponja para absorver tantas lembranças quantas eu posso, para guardar, e rever no futuro. Como minha maquina fotográfica quebrou na semana passada vai ser ainda mais difícil lembrar de tudo que eu vou ver nas semanas que vêm, mas eu estou escrevendo também, e eu sei que (por causa da internet) eu sempre vou poder conversar com a galera do programa, meus professores e outros amigos para relembrar os momentos bons que eu experimentei aqui.

Na verdade, além da abundância de atividades culturais e experiências pessoais com as várias pessoas que eu conheci, eu aprendi muito na aula de português. Durante as eleições, a gente conversou muito sobre a política, e por isso eu virei mais ligada não só à política brasileira, mas também à política internacional. Embora eu ainda não leia o jornal daqui, eu gostei muito dos artigos que a gente leu na aula, particularmente aquele sobre analfabetismo aqui na Bahia. Eu fiquei tão inspirada por esse artigo que eu estou pensando agora em estudar como alfabetizar crianças e adultos. Na verdade, eu sou poeta e gostaria muito ensinar poesia e aulas de literatura, mas quando eu reparei que eu conheço pessoas que nem sabem ler a palavra “poema” ou qualquer outra palavra que pode ser útil na vida, eu decidi aprender mais sobre alfabetização. Mas esse interesse novo não significa que eu vou abandonar os escritores que a gente conheceu na aula. Por exemplo, eu adorei os poemas de Cecília Meirelles, para quem nossa sala de aula está chamada. Também gostei muito de Clarice Lispector, e estou feliz que eu finalmente tenho um nível de entendimento de português com que eu posso ler e reconhecer as brincadeiras de palavra.

Eu também estou reparando que com o trabalho de produzir um texto cada semana, eu estou escrevendo bem mais regularmente, que usualmente é difícil para mim. Embora eu gostasse da liberdade de escolher nossos assuntos, era muito legal ter tarefas especificas como a entrevista. Eu me senti como uma jornalista verdadeira. É uma pena que o semestre terminou tão cedo porque eu ainda tenho idéias e observações que não tinha a oportunidade de desenvolver aqui. Vou guardar esses assuntos para o futuro. Espero que vocês me visitem no meu blog de vez em quando. Era um grande prazer dialogar com vocês. Obrigada pela sua atenção, sua companhia, e suas respostas.

Beijos,
Aichlee

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

a última carta...

Eu não tenho palavras. Não as tenho e acho que nunca vou tê-as. Não é por que não sei, além de sempre dizer isso. Digo muito essas duas palavras não sei e não é que realmente não saiba, porque com certeza a resposta fica lá dentro, guardada embaixo de toda a confusão sentimental – que nunca é algo claro. Eu sei, mas digo que não sei para me dar um pouco de tempo, para tentar encontrar as palavras certas para descrever o que quero dizer, o que sinto. Como traduzir sentimento em linguagem? Sempre fico frustrada sobre isso. É algo com o qual luto constantemente.

Já comecei mas ainda não sei como começar.....nunca sei quando vêm momentos assim onde existe essa oportunidade para dizer a coisa certa nas palavras perfeitas que traduzem o sentimento justo que quero transmitir. É essa a imagem que vai ficar para sempre ou pelo menos até eu voltar no imaginário das pessoas de quem sou eu. Tem que ser bonito, inteligente, pelo menos engraçado. Mas, ninguém me disse o que dizer quando nem sei o que é que estou sentindo. Suponho que seja uma mistura de coisas, suponho que para mim seja assim sempre, que o sentimento é tão difícil de traduzir em palavras por isso mesmo: a pluralidade. Não tenho as palavras certas no momento certo......em nenhum momento.

Às vezes acho que tenho uma visão romântica sobre as despedidas. É uma visão que tenho fixada na minha mente, onde tudo é lindo e triste (mas realmente é mais lindo do que triste). Preparo tudo para o dia chegar. Faço as compras. Vou ao Mercado Modelo de novo, ao Pelourinho dessa vez com cara de turista querendo comprar as coisas "típicas" que me davam vergonha comprar antes. Visito uma última vez a feira de São Joaquim para achar as mesmas coisas que sempre vi e que sempre deixei para lá, para comprar depois que supostamente irão servir como lembrança. Acho que a lembrança vai ficar nas memorias que fiz de cada viagem que fiz para esse mercado. Lembro de cada um, como uma viagem diferente, acompanhado por pessoas diferentes, me dando uma história nova para contar cada vez. Nunca me canso de ir lá, além de sempre passar por às mesmas bancas, cada vez é como a primeira. Faço um passeio pela cidade que eu conheço. Os lugares que freqüentei muito, os que sempre eram iguais, dessa vez também são iguais. Visito os lugares que sempre fui e não dá tempo de visitar os outros que tenho botado em uma lista. Ainda quero ir para a praia do Flamengo, Itaparica (ainda não fui!! Pode acreditar?), Ilha de Marê, Chapada da Diamantina, Morro de São Paulo.....e segue aumentando a lista. Aqueles lugares são a promessa de eu voltar. As coisas que não fiz, os lugares que não conheci....vão ficar para depois. No último momento, faço as cartas que vou deixar, dizendo as coisas que não posso dizer em voz alta, que sei que não vai dar tempo na velocidade corrida para chegar ao aeroporto que me espera nesse dia tão planejado para não ser assim, mas que sempre termina sendo assim. Corrido. Escuto música e tento enfiar na mala todas as compras e coisas que tão fácilmente entraram antes de sair da minha casa em Wisconsin em uma mala só. Será que o calor daqui aumentou o tamanho das coisas? Creçeram por eu morar tão perto da praia? Não a posso explicar.

Sempre acho que quando chegar na hora de me despedir de algum lugar e de alguma pessoa (às vezes se confundem) vou saber como reagir. No instante vou ter as palavras adequadas saindo da boca e vão sair com fluidez e ritmo. Mas nunca acontece assim. Tomara que só fizesse as cartas para no caso mínimo não saber expressar que vou ter tantas saudades, que aprendi (e talvez não a mostrei certo mas mesmo assim aprendi) de você, que não posso imaginar a minha vida sem você, a praia, o sol, os cheiros. Que me desculpa por ser chata e groseira as vezes, por desprezar você, por não aproveitar o suficiente do nosso tempo (que foi pouco) juntas. Como despedida, fico parada em um engarrafamento estressante, olhando o meu relógio cada minuto em vez de aproveitar os últimos minutos com você. Corro pelo aeroporto só para passar pelas guardas e para toda essa segurança ridicula que tem lá. É um sistema terrível, uma máquina quase cruel. Só para esperar sozinha, dentro do aeroporto, sem você. Nunca sai como quero, como tenho planejado na minha mente, romantizado, glorificado. Eu ainda não estou pronta para voltar. Ainda faltam muitas coisas, me sinto insatisfeita com o Brasil, com o que eu fiz aqui. Além de saber que fiz muito, que aprendi mais do que pensei que ia aprender, não é suficiente. Quero mais. O Brasil é assim. Uma vez que soube algo, fiquei ainda mais interessada, é hipnotizante. Tenho perguntas que ninguém me respondeu, tenho perguntas que nem fiz, tenho dúvidas que nem eu sei o que são.....ainda. Não quero me despedir, ainda não. Então, agora vou sumir. Com essa lista de lugares que ainda não visitei na minha mão, vou sumir. Sem palavra alguma porque já não precisa. Já sabe o que quero dizer....né? Pode ser que encontre uma carta na mesa ou na almofada da cama quando voltar da viagem que fez para me deixar no aeroporto. É essa carta que estou deixando. Sem respostas, sem despedida, sem palavras.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Sambando no Rio

Como primeira coisa tenho de dizer que sou desafinada e não sinto o ritmo, ou seja, para dizer a verdade, não sei nem cantar nem dançar.
Porém, como diz João Gilberto que "os desafinados também têm um coração", me emocionei muito assistindo ao ensaio técnico da escola de samba Portela no Rio.
Quando o guia me deixou sozinha às nove e meia da noite no grande espaço da escola, cheio de luzes e de gente, me senti perdida e pensei:"Eu que faço aqui?"
No começo achei que seria uma boa tática fingir de cantar, abrindo os lábios sem emitir som e mexer um pouco o corpo de maneira confusa mas discreta, sem atrair a atenção, mas pronto percebi que não precisava fingir nada, porque havia muita gente que ficava ao lado da pista só olhando.
Me senti muito aliviada, ainda mais por ver o que acontecia no salão, onde as pessoas que faziam o ensaio não tinham muita habilidade.
Era o grupo das mulheres, nem lindas, nem jovens, nem peladas: simples mulheres do bairro (Mangueira), algunas velhinhas ( uma tão velha que eu estava seriamente preocupada pela sua chance de chegar com vida até o final do ensaio ) e na maioria dos casos totalmente despreocupadas com o aspecto artístico e coreográfico do samba.
Era uma total anarquia: cadauna dançava com seus passos e suas figuras.
Algunas viravam de esquerda a direita e outras de direita a esquerda - ao mesmo tempo, claro-
uma levantava os braços, agitando a cabeça, en quanto a companheira ao lado guardava uma atitude de aristocrática compostura.
Inclusive as duas garotinhas que dançavam no tablado exibiam uma falta total de coordenação.
A coisa mais engraçada era que os intrutores não faziam nanda para disciplinar o caos: iam entre elas com os passinhoas do samba, cantando, sorrindo e senhalando a aprovação com a cabeça.
Outra coisa inacreditável é que todo o mundo no salão nunca parou de cantar a mesma canção por duas horas seguidas.
Viva Portela...Portela, você é a mais bela...
Naturalmente, cadaum do seu jeito.
Os intrutores recomendavam: mais alto, mais forte, pronuncia mais clara das palavras, e todos continuavam como antes.
E não agem assim por no ter em conta o evento, porque se vê que todos seguem com muita atenção e seriedade, inclusive as pessoas que ficam ao lado da pista de baile.
Ninguem está brincando!
Será que eles sabem que o samba é liberdade, livre espressão da pessoa que encontra a armonia no grupo?
Porque eu sei que nos dias do Carnaval acontece o milagre e a escola desfila, linda, organizada, uma verdadeira maravilha!
Será que o samba é como uma metáfora do Brasil, onde a partir do caos e da anarquia se chega à armonia e ao bem sucedido?
Pois não?
Paola

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

A questão de democracia racial no Brasil

O seguinte é um texto baseado em uma apresentação que eu fiz para o final da turma:


A questão de democracia racial no Brasil

O que é democracia racial?

A teoria de democracia racial diz que, em comparação aos EUA, nos países latino-americanos inclusive o Brasil, não existe o racismo intenso que caracterizou os relacionamentos raciais norte-americanos nos séculos XIX e XX.

A teoria esta baseada nesses três fatos:

1) Que, nos países latino-americanos, depois da abolição de escravidão, não existiam leis de segregação que permitiam discriminação racial.

2) Que, agora, não existe tanta violência racial (linchamentos e outros crimes de ódio) feita por grupos racistas como o KKK.

3) Que a miscigenação racial ocorreu muito na historia dos países latino-americanos

A teoria também diz que qualquer desigualdade racial que encontraria em América Latina existiria somente porque os recursos (como moradia boa, empregos com rendas agradáveis, e escolarização) antigamente eram negados por razoes racistas e não porque ainda existe racismo nesses países.



Aqui temos, Frank Tannenbaum, um sociólogo Americano que escreveu um livro, Escravo e Cidadão, que compara racismo nos EUA com racismo em América Latina. O livro, que foi publicado em 1947, sugere que existe democracia racial no Brasil. Eu li o livro no ano passado, e a maioria de meu entendimento de democracia racial vem dessa leitura.



Seguindo os teoristas da democracia racial, a igualdade racial existe em América Latina (e não nos EUA) por causa desses três fatores:

1) Como os colonistas ibéricos (que chegaram em América Latina) já tinham experimentado o governo dos mouros que durou quase 800 anos, não tinham aquele pensamento que pessoas com pele escura (quer dizer, os indígenas e os africanos) eram sub-humanos como pensaram os colonistas europeus (que chegaram em América do Norte.)

2) Ao contrario da doutrina puritana de América do Norte, catolicismo considerava os indígenas e os africanos como pessoas que tinham almas, então não tinham problemas interagindo pessoalmente com eles.

3) Os primeiros colonistas de América Latina não chegaram com suas famílias, como aconteceu em América do Norte e por causa disso eles tinham mais relacionamentos sexuais e emocionais com mulheres africanas e indígenas, o resultado sendo que ainda não se encontra discriminação racial por causa da miscigenação

Embora a idéia de democracia racial já esteja considerada um mito pelos sociólogos, ainda existem pessoas que chegam aqui no Brasil com a expectativa de achar um paraíso racial. Muitas vezes são afro-americanos.

Dois anos atrás eu li um artigo publicado em Essence Magazine, uma revista afro-americana, que enfocou nos homens afro-americanos que viajam cada ano para o Brasil. O artigo disse que todos os homens estavam largando mulheres afro-americanas para ficar com mulheres brasileiras, que eram prostitutas. Embora turismo sexual seja problemático aqui no Brasil, o artigo não tratou bem desse assunto e em vez disso virou uma reclamação xenofobica e ignorante. Eu pensei que o artigo era uma bobagem, mas tinha algumas respostas na parte de entrevista que eram mais interessantes. Os homens falaram que gostavam do Brasil mais do que os EUA porque no Brasil eles se sentem mais respeitados, pelas mulheres, pelos donos das lojas, e pelos garçons.

Na verdade, eu acho que eles estavam sentindo a valorização de ser americano e não de ser negro. Por que? Porque têm dinheiro. Geralmente profissionais da classe-media nos EUA, aqui eles são ricos. Se eles chegassem aqui e parecessem obviamente turistas com roupa americana, e falando inglês não teria como ficar ignorados nas lojas e restaurantes, ou considerados como ladrões ou traficantes. Por não ter sofrido discriminação parecida com ela que sofrem do dia a dia nos EUA, e também por ter visto (particularmente aqui em Salvador, que é um destino popular) a valorização da cultura negra, eles pensam que não existe problemas raciais no Brasil.



Aqui temos Ilê Aiyê, um bloco afro que tem muitas músicas contra racismo, sobre a valorização do negro no Brasil. O grupo é muito popular entre turistas.

Embora seja claro que todos os afro-americanos não pensam assim, eu queria falar do artigo só para mostrar que a idéia de democracia racial não é completamente antiquada.

Antes de chegar aqui, eu recebi um texto escrito por Professor Jefferson sobre ser negro no Brasil que ele escreveu para os estudantes do CIEE. No artigo ele tratou do mito de democracia racial e o papel que ele tem aqui no Brasil. Jeferson diz que a harmonia e evitação de confrontação racial fazem parte da nacionalidade brasileira, e também expressam a ideologia racial brasileira. Mas, embora ele avisasse que negros brasileiras não iam querer falar sobre racismo, eu já ouvi muitas coisas sobre racismo brasileiro, e vi ainda mais com meus próprios olhos.

Aqui, a desigualdade da moradia em Rio. Na frente tem apartamentos e hotéis de Copacabana, e no morro atrás tem uma favela.



Eu vi que não tem tantos negros bem escolarizados como brancos. Conheço várias pessoas analfabetas ou quase analfabetas. Eu conheço mais pessoas negras que não têm trabalho, ou que têm trabalho de serviço, como porteiro ou empregada. Eu já visitei duas favelas. Fui numa casa que não tinha água quente, nem gelador, nem comida na mesa. A mãe, o pai e 4 crianças moram na casa de uma sala e um quarto, separados só por uma cortina. Eu já vi quem é que janta nos bons restaurantes e quem dança nos boates chiques. Eu vi quem é que bebe na rua e quem vai para pagode. É assim como Brasil parece ser segregado sem o nome de segregação.



Aqui é uma mãe e suas filhas que moram no interior, numa cidade chamada Aratuípe. Pode ver que não tem muita roupa, nem tem vidro na janela.

Alem de ter leis contra racismo no Brasil, ainda tem racismo estrutural e sutil. Como Oracy Nogueira disse, discriminação racial no Brasil está baseada na aparência e não na origem. Então, pessoas com pele escura que seriam discriminadas podem equilibrar as desvantagens da sua cor com a sua inteligência, com dinheiro, com talento, ou por ser bem-vestido. Mas, ainda é difícil para um afro-descendente subir na sociedade porque o que determine sua posição na hierarquia social é muitas vezes a família, a escolarização, e o emprego. Então, existe a idéia que para subir na sociedade brasileira, um negro tem que ter um casamento inter-racial, ou fazer parte de atividades culturais ou seja como capoeirista ou como musico.



Aqui é uma casa de família que esta faltando um parede, com tijolos segurando o telhado.

Eu acho que um outro modo de subir na sociedade vai virar popular entre os negros aqui no Brasil. Durante a campanha de Obama, eu assisti no jornal inglês, um segmento sobre os sete políticos brasileiros que adotaram o nome de Obama para as eleições. O segmento enfocou num cara em particular, Cláudio Henrique, que mora numa cidade na periferia do Rio, onde ser político é um risco da vida. Ele queria ser prefeito para ajudar os moradores de sua cidade, que são pobres e sempre esquecidos pelo governo. Inspirado por Obama, ele falou muito de esperança e mudanças, que ele era o único candidata negro e que nunca tinha prefeito negro lá na cidade dele. Infelizmente ele e todos os outros Obamas brasileiros perderam.



Aqui é um quadro de Obama no Shopping Barra.

Mas os aspirantes políticos não estão sozinhos no culto de Obama. Têm muitas pessoas negras aqui no Brasil e nos EUA também, que pensam que os problemas raciais dos EUA acabaram com a eleição dele. Como ele vem de uma família misturada, e mostrou que podia juntar pessoas de varias raças para elegê-lo, crentes no mito de democracia racial tem um novo interes nele, porque a vitória dele pode simbolizar a superação da raça, e a criação de um mundo sem racismo. Eu acho que a vitória dele mostrou que negros no mundo inteiro tem oportunidades na vida fora de ser atletas ou músicos, mas eu nunca vou dizer que o racismo terminou por causa dele. A gente ainda tem muito mais trabalho pra fazer.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Rastaaaa

O conceito da identidade tem sido discutido ultimamente em função à idéia pós-moderna que a define como: "formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam (Hall, 1987). É definida historicamente, e não biologicamente". Então, basicamente isso quer dizer que a identidade é construída socialmente e não é fixa.

Eu quero falar sobre o meu cabelo e como ele atua de um jeito político em diferentes contextos. Quero analisar as conversas, as discussões, os comentários, e as falas sobre ele em diversos espaços e sentidos. O meu cabelo serve como um exemplo concreto da idéia da identidade pós-moderna. A opinião e identidade imposta sobre mim pelas pessoas que me rodeiam muda à medida que desloco o meu corpo no espaço e no tempo. Ao longo desse trabalho, vou fazer referência às categorias de sexo, gênero, nacionalidade e classe porque essas categorias são políticos e o meu cabelo é político.

Então, a pergunta principal que fazem sobre o meu cabelo é o por que. Normalmente as pessoas vêm, se aproximam e dizem....como é que você faz isso?....como pergunta para abrir a conversa. Falo sobre o jeito de dar nós e como trabalho com a argulha de crochet, que só lavo a parte da cima, só boto xampu na cabeça e deixo a água escorrer. Falo que sim, posso entrar na água e nadar só mas que o penteado rasta se desfaz mais fácil assim, então tento não molhar. Falo que quando molho o cabelo, ele demora muito para secar, que é pesado quando está molhado. Logo as pessoas (algumas perguntam e outras não) tocam uma mecha do meo cabelo. Tocam com muita delicadeza, como se fosse quebrar no contato com a mão. Elas inspecionam o cabelo, sentindo a sua textura o rolando na mão. Aí é que fazem a pergunta....e é todo seu esse cabelo? Sim, é sim. E então, é que chegam à pergunta que realmente queriam fazer no começo....por que fez isso ào seu cabelo? As palavras que usam para traduzir a sua curiosidade sobre o meu cabelo transmite a violência atrás por trás da pergunta. É como se o cabelo fosse estuprado. É vítima que merece algum tipo de consolo e carinho depois de um processo assim. Obviamente isso varia de pessoa a pessoa, de conversa a conversa, às vezes é mais cumprida e têm vezes que é mais breve. Porém, quase sempre envolve essas idéias básicas acompanhado com o elemento violento: eu fiz algo ao meu cabelo que o meu cabelo mesmo não queria. Para todas essas perguntas sobre, como, quanto, do meu cabelo, tenho respostas claras, definidas, preparadas e praticadas. Podia ser uma gravação que coloco no momento de alguem perguntar. Faço a voz aumentar do tom, o sorriso, as palavras iguais....tudo igual, todas as vezes. Já virou uma rotina. Só que quando chegam à pergunta final, não tenho uma resposta. Sempre fico sem palavras, sorrindo como se fosse a primeira vez que alguém me perguntava. Falo....mmmm, não sei por que fiz...gostei da aparência. Fiz com uma amiga num momento especial da minha vida, é um tipo de lembrança. As pessoas ficam decepcionadas com isso. Não era o que esperavam ouvir.

O meu corpo é político. É um campo de batalha que provoca classificação e preconceito à vista. É um dos sinais visíveis à distância: não sou daqui, como luzes fosforescentes piscando para atrair ao cliente. Rastaaaaaa, rastafari woman, rasta girl, bob marley, reggae. Tudo isso são comentários que ouço na rua pelo menos uma vez por dia. Não quero abordar o tema do machismo nem tocar nas idéias das cantadas na rua aqui. Não é esse o meu propósito, não dessa vez. Aqui, agora gostaria de falar sobre o conceito da identidade e da minha visão de como é visto aqui, onde sou gringa rasta. É obvio e visto de muito longe, e é fato. Aqui, as pessoas me perguntam se sou negra, se tenho ancestrais negras e quando digo que não, falam....mas, gostaria de ser negra? E as vezes ....mas, você deve ter sido negra em uma vida anterior. Uma vez estava no mercado modelo e estava querendo comprar uma estátua de uma mulher negra....essas de madeira que vendem lá. A mulher que estava me atendendo, me fez essas duas perguntas. Eu falei que sim, gostaria de ser negra e ela com um sorriso na sua cara falou, mas gostaria de ser de que cor? Gosta do meu cor ou desse (falou apontando para uma estátua, a mais negra que tinha no seu quiosque). Falei que não sabia e que tinha gostado das duas. E ela falou....mas, com certeza você foi negra em uma vida anterior. Essa reação foi muito diferente da que recebi na minha casa aqui e em outros lugares da cidade. Aqui, quando cheguei em casa pela primeira vez, minha irmã hospedeira falou para mim, "e...você fez o cabelo assim?" falei que sim, fazia três anos. Ela me olhou com uma cara quase de nojo e disse "eu nunca faria uma coisa assim" e acabou a conversa. Também outras pessoas tem me perguntado por que fiz isso ao meu cabelo liso. Uma vez, esperando o ônibus foi engraçado porque uma mulher começou a me falar sobre a manutenção desse estilo de cabelo. Falei para ela todas as coisas que sempre falo e ela ficou calada. Depois de um tempo, ela falou com um pequeno sorriso (percebei um pouco de tristeza atrás dela) “...é engraçado porque eu faço qualquer coisa para alisar o meu cabelo e você o tem, mas faz rasta. A gente devia trocar de cabelo.” Ela deu uma risada e subiu o ônibus.

O interessante é que as reações ao meu cabelo são diferentes, a depender dos lugares do mundo onde esteja. Tem as pessoas que nem sabem o que é um cabelo rasta. Me dizem, que lindas tranças! Quanto tempo tem? (Isso aconteceu na sua maioria das vezes no México). Quando falo, hum uns três anos, suas caras mudam completamente de interesse para um tipo de choque. Segue a pergunta....e como é que você consegue lavá-lo? Falo que são rastas e que lavo a cabeça só duas vezes por mês blá blá blá. Aquelas pessoas dão um passo para trás e com um sorriso na cara falam..... “ahhh...interessante.” Nos EUA, a reação mais interessante que tenho para compartilhar foi uma vez que estava trabalhando em uma clínica veterinária e enquanto estive agarrando um cachorro, o seu dono tocou o meu cabelo e falou..... “isso!? isso...é arte.” Durante a sua visita enteira estava comentando sobre quanto adorava e apreciava o meu cabelo. Outras pessoas lá nos EUA acham que só sou uma pessoa suja. Que nunca tomo banho e que vou roubar algo das lojas deles. Na Argentina foi interessante porque lá está na moda ter cabelo rasta. Entre outras razões, os argentinos, muitas vezes, achavam que eu fosse de lá e nem comentavam nada. Porém, finalmente, sempre para os hippies de qualquer lugar do mundo, significa não que gosto, mas que adoro a música reggae e sou rastafari de coração (sempre acompanhado com essa idéia de que gosto da natureza e de fumar maconha).

Agora, com isso, cheguei à questão da identidade nacional. Representa uma parte significativa da identidade de uma pessoa, pelo menos a gente foi criada para pensar assim. Obviamente de certa maneira funciona porque uma das primeiras coisas que as pessoas me perguntam no momento de nos conhecer é... é você da onde? Sempre digo que sou americana. Mas, muitas vezes nem me sinto americana. Não sei o que quer dizer ser americana. A nacionalidade é feita de fronteiras (muitas vezes) criadas ou pelo menos designadas e manipuladas pelos seres humanos na luta por ocupar um espaço maior para "um grupo determinado" de pessoas. Mas, realmente o que quer dizer isso? Como é que alguém chega a pertencer como integrante dessa coletividade de pessoas? É só o fato de ter nascido naquela região do mundo que supostamente educa a população "nacional" de certa maneira para que se sentem unificados? Eu sou americana. Essa é uma das minhas identidades aqui em Salvador (talvez a mais importante) porque ao dizer isso, vêm certos "privilégios" e outros preconceitos. Falo com sotaque norte-americano. Caminho do jeito norte-americano. Muitas pessoas me acertam e me chamam americana na rua. Mas, tem vezes que acham que sou argentina ou francesa ou as vezes alemã ou italiana. As vezes não corrigo eles, as vezes sim. Que aspecto do meu visual dá a impressão de que sou de um dos países que não é o meu? Acho que o meu estilo do cabelo tem provocado muitas dessas decisões de classificação, com um fator em comum: meu estatus como estrangeira.

A minha identidade flutua no espaço. É algo imposto em mim por outras pessoas. Até chega mais além do que só o preconceito baseada no cabelo rasta. Por roupas que uso e a biologia que elas escondem, faz que as pessoas pensem saber que o meu gênero é feminina, que sou mulher. Só que não raspo o cabelo das pernas (e essa é uma qualidade de homem). Então, pode ser que seja lésbica. As pessoas ficam pensando....será? É interessante que posso mudar a opinião e manipular o censo das pessoas de acordo com o visual que apresento. Que sou? Todo mundo julga as pessoas pela primeira impressão que lhes dão. Me dizem então, quem sou hoje?

Imagino que essa é a minha resposta da pergunta por que deixei o meu cabelo rasta. Já a respondi. Mas só com dizer que gosto da conversa que provoca nas pessoas dá justiça à complexidade da resposta elaborada com toda essa explicação? Não posso fazer esse discurso todo em uma rotina, nem quero fazer isso. Porque entre a poeira acumulada e sal do mar, enrolado no meu cabelo ficaram milhares de impressões, e comentários para sobrar. Ela vem com explicações e preconceitos, provoca conversa e estranhamento. O meu cabelo é inspirado e grotesco, é seco e molhado, feito e deixado. É tudo e é nada. O meu cabelo é o meu cabelo e não preciso um por quê. O meu cabelo é político porquê.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

O meu mapa afetivo de Salvador

Queria falar de Salvador através das minhas excursões em ônibus ( que são uma maravilha ) porque eu, por a minha condição de estrangeira, tenho de ir habitualmente para alguns lugares como à Receita Federal, que agora fica no aeroporto, e como o Consulado da Itália, em Aflitos, perto do Campo Grande.
Para ir à Receita Federal pego o ônibus "Aeroporto" que vai até Itapuã, passando pela Orla, que eu adoro, porque adoro o mar.
Na Itália eu moro numa ilha e perto da minha cidade tem oito quilómetros de praias, mas elas não pertecem à cidade, porém ficam ao lado.
Aqui é diferente, porque antes havia a natureza: o mar cheio de peixes, a mata atlántica, os animais da floresta.
Agora não sobra nada daquele mundo, só os nomes: Pituba ( o grande camarão ) Jaguaribe ( água dos jaguares ), lembranças de lugares salvagens, povoados pelos índios e pelos animais. Agora eu olho os aranhaceus de Pituba e as casas residenciais de Jaguaribe e penso que, embora ficando con medo, preferiria ver os jaguares.
O único bairro do qual eu gosto de verdade é o Rio Vermelho, muito interessante, porque se podem observar claramente os dois níveis da história da comunidade: a parte burgueza com os casarões decorados de ornamentos frorais, os jardins particulares e todo um aspecto que remonta ao início do século xx; e a parte popular, com as barcas e as rêdes dos pescadores.
Em cima de tudo, vigia a estatua de Yemanjá em forma de sereia, como para lembrar a todos que o povo do Rio Vermelho pertence ao mar.
Um caminho bem diferente que tenho de fazer várias vezes para ir à Casa da Itália é a rua 7 de Setembro, até Barris.
Pego o ônibus "Praça da Sé/Vitoria" que passa pela Oceânica e pela Ladeira da Barra.
O panorama da Oceânica, entre o Morro de Cristo (com seus coqueiros) e o Farol da Barra, é maravilhoso.
De manhã o de tarde sempre está cheio de gente: as praias de meninos brincando com as ondas ou treinando surf, a rua de pessoas que correm para emagrecer e ficar numa boa forma física.
A calçada entre o Farol e o Porto sempre está ocupadas pelos vendedores de objetos artesanais de todo tipo (joyas, instrumentos musicais, plumas de papagayo), camisas e vestidos, comida e bebida.
Depois o ônibus sobe pela Ladeira da Barra, passando em frente do Forte de S. António e do Yatch Club, e se pode curtir uma vista estupenda: o mar, a ilha de Itaparica, os barcos pintados de branco balançando sobre a superficie do mar.
Ao final da ladeira o ônibus entra no Corredor da Vitória, a minha rua preferida porque tem uma manga gigante, uma árvore única em Salvador: cresceu tanto que entrou no muro!
No Corredor da Vitória também ficam antigas vilas agora convertidas em museos ou em residências estudiantis, muitos prédios antigos e lindos, mas, sobretudo, árvores antigas e lindas.
Só tem uma coisa da qual eu não gosto muito: uma aparência rica e aristocrática que eu acho bastante antipatica.
Porém o final da viagem, pra mim, é muito mais alegre e simpático: a rua da Piedade com suas lojas baratas onde se pode encontrar tudo e os assistentes de venta que procuram convencerte de que você precisa de tudo.
Eu acho que descer do ônibus, entrar nas lojas, dar uma olhadina, falar com a gente que vende
é como fazer uma segunda viagem, tal vez mais interessante que a verdadeira.
Mas o meu relato não seria completo sem falar dos vendedores ambulantes nos ônibus.
Eu acho que pude perceber o significado autêntico do trabalho pesado vindo como eles agem e escutando as suas histórias.
Eles são incansaveis: sobem e descem sem parar um momento, sempre carregando a mercadoria que muitas vezes parece ser pesada.
Falam muito, entram em contacto com os passageiros, contam histórias pessoais, promocionando os seus produtos como se fossem produtos de grandes firmas, porém na verdade é mercadoria pobre.
É preciso ter muita criadividade e muita coragem para passar assím o dia todo e eu os admiro muito por isso.
As minhas excursões por Salvador terminan aqui.
Esperemos ter outra oportunidade para falar mais, tal vez sobre diferentes lugares de Salvador que ainda eu não conheço bem e que espero conhecer no futuro
Um beijo
Paola

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Turistas em Salvador

Na passada semana aconteceu algo pra mim insólito: ver o comportamento de um turista em Salvador. Eu moro aqui há dois annos e acho que o meu olhar está compenetrado de baianidade, mas tive a oportunidade de experimentar o olhar turístico e eurocéntrico através o comportamento de uma amiga que veio a visitar-me e que acompanhei nas voltas que ela deu pela cidade.
Como primeira coisa eu pude perceber que todos os turistas são iguais, procurando os mesmos lugares e as mesmas experiências: as Praias, Pelourinho, as caipirinhas na Cantina da Lua e a capoeira da escola do Mestre Bimba e só gostam das excursões organizadas.
Por exemplo: têm muitos ônibus fazendo o trecho Salvador-Itapuã, com um custo de dois reais, mas o verdadeiro turista prefere pegar o ônibus turístico e pagar muito, muito mais.
Sempre ele fica encantado: "Que lindas praias! Que sol! Que paisagem!"
Não percebe que os ônibus urbanos viajam ao lado do seu e que a paisagem seria a mesma?
O verdadeiro turista não gosta de visitar muitas igrejas ou museos no Pelourinho, porque acha que são todos iguais, mas gosta muito de entrar e ficar horas nas lojas de souvenir que, todo mundo sabe, têm a única função de roubar, oferecendo a mesma mercadoria que oferecem os vendedores de rua ao dobro ou ao triplo do preço.
Mas os turistas gostam de ser roubados pelos lojistas e não pelos vendedores de rua: com os primeiros compram sem discutir, porém com os segundos se comprometem em debates que ném a cumbre mundial de G20
E pra que? Pra não gastar um punho de reais que quase não têm valor em euros.
A verdade é que não querem nem perceber a existência de problemas.
Quando a pobreza, representada pelos meninos do Pelô e pelos vendedores de colares, se aproxima a eles, reagem como quem dissesse:
"Por que você não segue sendo invisível? Não sabe você que os meus olhos só querem ver coisas bonitas?"
Não sei, espero não ser muito pessimista mas è mesmo a impressão que eu recebo muitas e muitas vezes.
Um saludo de esperança pra que as coisas e as pessoas melhorem
Paola

sábado, 15 de novembro de 2008

A cultura transplantada e a resposta à loucura pro Obama

O sábado antipassado fui ao jazz no MAM. Se não chover, é um evento que ocurre o ano enteiro no Museu de Arte Moderna (MAM) aqui em Salvador. Uma banda local toca música após do pôr o sol (18:30) até aproximadamente as 21 horas. Acho que posso dizer que é um dos meus lugares favoritos aqui; me lembra muito o verão em Madison com a música de sexta-feira acompanhado com o ambiente e o som das ondas chocando com as rochas e os barcos lá na frente, a cerveja gelada, a fofoca voando livremente na brisa. Tudo tranqüilo, tudo lindo, tudo erudito. Quanto mais desce o sol, mais as luzes artificiais das casas distantes aparecem como refleição dos imagens delas, como estrelas do céu caidas na terra. A vista realmente é lindo; é um lugar encantador. Mesmo não sendo muito fã da música jazz, adoro ir ao jazz no MAM. É o conjunto da música, a vista, o mar, e as pessoas que criam o espectáculo.

O sábado quando que fui ao jazz, mesmo o cenário sendo familiar, o jeito das pessoas ainda não era. Conheci um rapaz de trinta e tantos anos aquele noite e quando ele soube que eu era dos EUA començou falar em voz alta, quase gritando, que seu inglês não era muito bem e que morou um tempo no meu país, no Alabama. Logo ele começou a me explicar o racismo que ele experimentou lá. Só que o racismo que ele experimentou era porque o consideravam branco. Na sua visão, os EUA são um país racista porque apesar de ele ser baiano, lá era branco. Me falou que morando lá, ele ensinou em um colegio dominado pela presença negra mas se estranhou por o sotaque e o uso da giria muito forte dos negros, coisa que ele jamais conseguiu entender nem menos encontrar jeito de expressar. Me falou muitas coisas sobre o meu país que, na verdade, eu nunca tinha experimentado. Explicou que o povo lá era racista com ele porque ele era branco e aqueles negros não gostavam dos brancos. Que era um país segregado e quando ele tentou se integrar eles recusavam. Então, falou para eles apontando para seu braço meio moreno dizendo “Não! Não! Sou Baiano! Sou negro, gosto dos negros, sou um de vocês”. Ainda assim, eles se comportavam de um jeito racista segundo ele, excluindo ele por ser branco. Aqui é negro, lá é branco e quem sabe o que aconteceria na Europa ou na Ásia ou na África. Então raça é uma questão da preferência e definição pessoal? Não pode ser tão livre porque tem limites sociais que permitem certas pessoas se classificarem como negro e outras não. Então, onde fica essa linha? O que é necessário para se classificar como uma raça ou outra? Claro, o aspeto teórico não elimina o preconceito nem os exemplos concretos e reais de discriminação baseada nas definições da raça aceitadas socialmente.

Os EUA são um país racista. A história e inumeráveis exemplos modernos podem comprovar isso. Mesmo assim o tempo todo aqui em Salvador ouço palabvras e discursos tão racistas que não sei da onde vem esse concepto de que o Brasil não tem preconceito. Ainda não tive a oportunidade de viajar muito pelo país, porém, depende do ambiente mas mesmo aqui as pessoas me confirmam que o Brasil é um paraíso racial e que só existe a livre mistura de raça e isso concorda com a imagem exportado do Brasil também. Aqui na Bahia talvez as coisas são um pouco diferentes e a questão racial chegou alcançar a um nível acadêmico tanto que em Salvador tem uma parte da UFBA dedicada somente aos estudos disso (CEAO, centro de estudos afro-orientais), coisa que pelo momento acho absolutamente necessário para visibilizar o tema.
Com o olhar sempre voltado para fora (os EUA e Europa e as vezes só o sul do país), as pessoas daqui ficam falando, discutindo, até apaixonando de um discurso e por uma esperanza que talvez não lhes é própia de uma forma direita pelo menos. Fui para o Rio de Janeiro faz duas semanas e teve um rapaz lá que fez uma escultura na areia deletrando Barack Obama e saiu em cinco jornais o próximo dia. Quando fui ao Pelourinho o dia da eleição, entre todas as pinturas coloridas típicas da Bahia, vi um retrato de Obama. No Porto da Barra, vi um rapaz com uma camisa rosa com a foto de Obama em frente e o arcoiris atras. Por cada lado que viro a minha cabeça têm arte e manifestação por o apoio a Obama. Todo isso antes das eleições para empurrar essa energia boa na atmosfera e fazer que ele ganhasse (agora ganhou, suponho que funcionou).
Nos dias posteriores das eleições presidenciais dos EUA, os jornais baianos estavam lotados de artigos, comentários, e demias sobre o novo presidente-eleito Barack Obama. Em particular, gostei de um que saiu no jornal A Tarde, entitulado assim: “Barack Obama – o sonho da Bahia” por João Jorge Rodrigues (http://www.atarde.com.br/jornalatarde/opiniao/noticia.jsf?id=1003813). Nesse artigo não muito cumprido, um jornalista baiano comentou sobre a reação e esperança do povo brasileiro enquanto às noticias dos EUA terem eleito um presidente negro como o novo poder. Abriu o artigo dizendo: “A eleição americano foi capaz de revelar um fenômeno social modderno” e seguiu desse jeito até usar uma palavra que acho muito adequado aqui Obamania. Realmente as pessoas ficaram loucas por saber que os americanos eram capaceis de escolher um homem negro como presidente e até ficaram sorprendidas quando vieram a reação positiva e emotiva de muitas pessoas brancas, asiaticas, latinas retratados na tevê chorando com emoção por saber que Obama ia lhes representar pelo menos por os próximos quatro anos. Diz o artigo que com a eleição de Obama “nos inspira a lutar mais para realizar o sonho dos meninos e meninas negros esquecidos na periferia da cidade-mãe do Brasil”. Tudo transplantado, tudo olhar da fora analizando o Brasil, dizendo o que deve fazer e que deve arreglar, fazendo modelo para o país seguir, até o racismo nesse país. Na minha aula de Historia Cultura Brasileira, falamos o semestre enteiro da cultura transplantada da Europa antigamente e agora mais com os EUA e como as vezes (muitas vezes) não deu (da) certo aqui mesmo por serem transplantados numa sociedade que não sofreu a mesma historia da Europa. Antes nesse blog, analacei a cultura brasiliera de acordo com o olhar queer que aprendi nos EUA. Agora gostaria de escutar uma teoria de raça que vem daqui. Quero ouvir e ler textos produzidos pelas pessoas que são daqui para não seguir a vissão transplantada que tanto foi exposto o Brasil.
Por mais que gosto que as pessoas fiquem felizes por causa dos resultados electoriais do meu país (o que me faz sentir orgulhosa de pertencer à comunidade que fez possivel essa mudança) ainda é muito presente a idéia de transplantação da cultura. Quando vou ao jazz no MAM, me sinto transportada, transplantada ao mundo da fora, a minha casa. Mas o momento que eu pisar na rua lá acima, tiro o meu spray pimenta da minha bolsa e caminho a casa, olhando sempre atras de mim. O que quer dizer isso? Estou já cansada do meu discurso. Quero que uma pessoa baiana me diz.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Um dia na praia...

Passando o fim de semana no Morro de São Paulo, eu me dei conta da economia turística lá e me lembrei que eu queria fazer alguns comentários sobre a economia da praia aqui em Salvador. Como eu sou de uma cidade (Filadélfia) que não tem praia, eu só conheço a praia americana de longe. Embora tivesse ido a praia em Nova Jersey não mais que cinco vezes na minha vida, eu sei que o espaço comercial lá e o Boardwalk, a calçada feita de madeira ao lado da areia, onde tem hotéis, restaurantes, lojas que vendem lembranças, a parque de diversão, e minha lugar preferida, a fliperama. Quando eu cheguei aqui em Salvador, eu fiquei fascinada com a diferença entre o comércio da praia brasileira e o das praias que eu conheci nos EUA.

Primeiro, sem o Boardwalk como espaço comercial, os vendedores levam todos os seus produtos nas costas pela areia e andam de um lado ao outro, tentando vender suas mercadorias. Eles geralmente reconhecem os gringos de longe e muitos sabem falar pelo menos o nome do seu produto em inglês. Quase todos os vendedores são simpáticos (quem quer perder clientes?) mas alguns também são tão agressivos até que você pode se convencer que está precisando de alguma coisa que nem poderia usar na praia.

Eles têm de tudo! Têm pulseiras tecidas, biquínis de coco, chapéus de folha de palmeira, brincos, colares de contas de vários tamanhos e cores, DVDs e CDs pirateados, redes de descanso, vestidos e muito mais. Têm coisas que você pode precisar na praia como protetor solar, bronzeador, creme para oxigenação do cabelo, óculos de sol, e cangas. Têm também coisas que eu nem podia imaginar encontrar na praia como tatuagens de henna, consultação de tarô, livros de segunda mão, quadros pintados, e manicures. As únicas coisas que você não pode vender na praia são a areia e o mar.

Pode ser velho ou ainda criança, tem vendedores de todo tipo, inclusive eu! Inspirada pela manicurista eu já fiz meu próprio trabalho lá, enrolando o cabelo rasta de um amigo meu, depois do qual eu ganhei o interesse de mais três clientes. Eu nunca imaginei abrir um salão de beleza, contudo na praia, até eu cheguei aqui.

Mas os vendedores de roupa e os artesanatos não são os únicos trabalhadores da praia, também tem os caras que aluguem cadeiras e sombreiros enquanto vendendo bebidas. Embora a prática de alugar cadeiras seja ilegal, como eu li nesse artigo, é muito comum, particularmente no Porto da Barra. Tem vários grupos (devem ser chamados empresas pequenas) competindo alugar espaço na areia e cada um tem seus clientes fiéis, que ficam na mesma parte da praia cada vez que visitam.

Além de tudo, os vendedores dos quais eu gosto mais são os que vendem merendas. Embora eu goste de merendar, eu prefiro eles mais por causa do seu jeito de chamar a atenção dos consumidores. Cada um tem um anúncio reconhecível. Por exemplo, o velho que vende picolé tem um assobio que você pode ouvir de longe. O cara que vende limonada sempre fala, “O limão chegou! Limonada!” Finalmente, ninguém pode esquecer dos vários gritos de "Queijo!!" ou da música dos vendedores de Camarão do João com sua repetição de camarão e João em várias frases. Não dá muito para relaxar na praia assim com tantas vendas, mas para mim, não é um problema porque eu gosto mais de socializar e observar as pessoas e suas interações.

Foi pelas minhas observações que eu descobri que ainda tinha outras pessoas trabalhando na praia sem parecer trabalhar. Tem guias turísticas fazendo amizades com gringos, oferecendo levá-los aos lugares bons da cidade. Tem prostitutas. Tem “caçadores” que vivem namorando gringas. Tem alguns capoeiristas que treinam e dão aula na praia e outros que dão saltos espectaculares para chamar a atenção dos gringos que podem levá-los fora do país para fazer apresentações. Tem pessoas que trabalham só pela conversa. Tem pessoas fazendo propaganda para boates e restaurantes, que convidam os turistas às festas. Tem outras que falam de apartamentos vazios ou que recomendam pousadas boas. Todo isso é trabalho que acontece na praia.

E no final do dia, depois de aplaudir o sol, você pode ver os pescadores. Pode ver pessoas que recolhem latas e garrafas, outras que colocam o lixo nas lixeiras, e outras que esvaziam as lixeiras. Tem varredores que tiram a areia da calçada à noite e outros que lavam as escadas de manha cedo. E daí tudo se repete de novo.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

quem tem ... troca pra cinqüenta?

Viaje comigo por um momento. Imagine que estámos no meio do deserto num país estranho, sem água, sem comida. Só temos uma montanha de côcos ao nosso lado, mas faltamos uma facão para os abrir. Nem temos rochas. Estámos perdidos numa mar de areia, suando na sombra da nossa montanha de côcos e morrendo de sede. Há um pouco de trafico que passa, vendedores andando para a próxima cidade, uns carros com janelas escuras. Talvez um deles tenha uma faquinha? Mas como vamos perguntar? Eles falam uma língua diferente. Talvez a pessoa que pidamos vá robar nossos côcos e nos deixa numa condição pior da que comecamos.

As vezes, tenho a mesma sentimento aqui em Salvador. Terei dinheiro para gastar, mas faltarei a habilidade de o gastar. Como assim?, posso ouvir vocês pensando.

Simplesmente é o seguinte. Você sai da sua casa com cento e dois reais. Você gasta dois reais para pegar o ónibus para ir à faculdade. Suas aulas acabam, e você tem que voltar para casa. Você espere para o ónibus no ponto. Depois de uma meia-hora, você vê seu ónibus chegando. Joga uma mão, e o ónibus para. Até aqui, tudo está dando certo. Sobe as escadas, e você... você já devem saber o que vai acontecer. O rapaz vai dizer que ele não pode fazer troca para cem reais. O que você estava pensando, amigo? Você vai ter que desecer as escadas e pegar um taxí. Talvez ele tiver troca.

Talvez minha história seja um pouco fantástica, mas a verdade é que troca faz uma questão importante na vida de um estrangeiro em Salvador. O problem é que você não pode pagar para o ónibus com um cartão de crédito e que as máquinas de dinheiro nos bancos gostam de te dar cédulas enormes. Minha vida seria ótima se as máquinas banqueiras me desse cem reais em cédulas de dez reais. Cédulas de cinco seria melhor ainda.

As vezes, e particularmente no ónibus, tem que ter troca, mais ou menos, exata. Peguei um ónibus, voltando da Garibaldi pra Barra, que ao início, negou aceitar meu cédula de dez reais. Simplesmente, o rapaz da caixa não tinha troca. Que incrédulo, né? Convenci-lhe que ele pegasse troca antes que chegassémos no meu ponto, mas assisti, dúvida crescendo dentro do meu coração, como estudante depois de estudante com um cartão de mágico entrou no ónibus sem pagar. Houver uma mulher com dez reais no ponto depois que tentou entrar no ónibus também. Ela foi negada, e mandada para esperar e rezar que o próximo tivesse troca.

Desenvolvi umas estrategens para guardar minha troca e cédulas pequenas. Nas restaurantes, sempre uso a maior cédula que tenho. Eles sempre têm troca, e se não fazem pelos outros clientes. Num restaurante, alguém sempre tem. Quando uso as máquinas banqueiras, pido um número estratégico. R$222, R$188, R$334. (Nunca, nunca use números que são divisíble por R$100 e R$50!) Se você está comprando uma coisinha (seja chiclete ou uma maçã) num supermercado com $R50 e o caixa pergunta se você tem algo menor, a resposta é (senão caso de depressa) não. Talvez você tenha que esperar uma meia-hora e a fila atrás de você vá reclamar, mas sua troca aparecerá. Não desista!

É nos casos como no ónibus quando me sinto a maior saudades para a simpliciadade da vida nos EUA. Lá, saio de casa com meu cartão de crédito, sem pensar em troca ou cédulas. Posso pagar para tudo com ele. Nada é maior ou menor demais para ele. O hambuguer de McDonalds? US$0.96 no meu cartão. O novo vestido para o casamento da minha irmã? US$400 no meu cartão. Ô Visa, te adoro! (Mas acho que as vezes minha vida é mais semelhante às propagandas do Mastercard.)

até mais meus prezados leitores,

lisa

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

O desdén de ser politicamente correto

Poderia recorrer de novo todo o que já tinha escrito sobre categorias e como desde criança a gente aprendeu de acordo delas. Agora, tanto faz se você estiver disposto a viver ou não de acordo com essas categorias. O ponto é que existem e a gente mora dentro da sociedade que funciona assim. Então, tudo bem...até chegar às "categorias" das pessoas. Ao mesmo tempo de que a gente foi criada para reconhecer certas categorias e padrões normalizados na sociedade, não é aceito dizé-as com referência às pessoas, pelo menos não nos EUA (refleitado um pouco na postagem anterior de Lisa sobre peso). Era impregnado em nós, com pouca sutileza, não categorizar certas "coisas", o seja, tipificar as pessoas. Fazer isso é considerada má educada e no caso (talvez só americana) discriminatória. Tudo isso até chegar à palavra terrivel que nenhuma sociedade quer admitir que exista nela; implica a categorização com base na cor: o racismo. Então, categoirzar é mais do que aceitado, é reenforçado socialmente só que não é aceito em certas circunstâncias. Enquanto na escola e fora fomos socializados para reconhecer e viver de acordo com categorias hierarquizada da raça e de gênero entre outros, não era "educado” categorizar e generalizar "tipos" de pessoas com base na raça nem na etnia, pelo menos não em voz alta. Eu nasci no meio da década dos anos oitenta quando a televisão americana começava ter personagens e clamor da falta de personagiens principais "negros" ou "latinos". Com certeza essa mentalidade de luta influiu em minha formação e a de todas as pessoas de minha geração.

Talvez isso faça sentido no contexto de um país com uma história tão forte de imigração como os EUA, mais existem outros países na América mesmo (a Argentina, o Brasil por exemplo) que partilham dessa história em comum. Então, qual é a diferença? É que as pessoas dos EUA ficam com medo de ofender as pessoas e é só uma maneira de esconder o racismo inerente nas pessoas ou realmente é válido? Já ouvi falar muito aqui com um tom desdénhado quase chegando à raiva por causa das pessoas ficarem com esse "medo" de falar "a verdade". Elas se defendem dizendo que são honestas e direitas e é uma característica “inerente” à identidade nacional brasileira. Mas, não sei se acredito nisso. Todo lugar que tenho visitado tem esse mesmo desdén pela atitude "americana" de sensibilizar e esconder o que segundo os demais, a gente sabe e está pensando só que não dizendo. Muitas vezes escuto comentários de pessoas na área de "ai ai, mais dizer isso é politicamente correto" acompanhado com o movimento suspeito dos olhos e o nariz feito em arrugas. Praticamente é a pior coisa que alguém pode fazer: dizer ou produzir algo que é considerado politicamente correto. Sempre voltando ao contexto histórico, talvez possa fazer sentido o porquê da mentalidade politicamente correta do povo americano. Mas só entender a base histórica de porque surgiu não significa que a gente tem que aceitar essa ideologia nem viver de acordo com ela. Não é? Mas, realmente será que é uma diferença de opinião só? Uma simples perspectiva ou olhar distinto? Ou será que estou sofrendo do que chamam de "choque cultural" agora, quatro meses depois de ter chegado ao Brasil? Uma amiga me falou que devia ser uma questão da adaptação cultural assim. Deve ser uma diferença desse tipo mas não sei se acredito nisso. Já tenho escutado e visto muitas coisas aqui que me deixam tão surprendidas e ofendidas. Por exemplo, vi uma cartaz anunciando a novela “negócio da china” com todos os personagens (oito pessoas pelo menos) brasileiros fazendo “olhos chineses”, o seja, com os dedos dos mãos estirando os olhos para que ficarem mais finos e menos redondos. Ou cada vez que alguém me da uma descrição de uma pessoa, se tem uma mínima possibilidade que os demais lhe reconhecem como gay, é a primeira característica da pessoa dada: você sabe....ele é alto, loiro, aaa ele é gay! Sabia? Como se com esse comentário fosse a única característica importante e marcante da pessoa. Ou, também, quando as pessoas me respondendo depois de eu contar que fui assaltada duas vezes: a sim, você tem que ter cuidado nesta cidade. Têm muitos negãos que te podem roubar. Como se tinha incluido o cor da pele das pessoas que me assaltaram como fator principal do evento. Sempre depois das pessoas falarem assim, fico calada, com uma sorrisa falsa na minha cara, fixada numa transe sem palavra alguma para dizer. O que é que eles estão esperando de mim? Se é uma resposta verdadeira ou “honesta” que querem, acho que não vão gostar mais de mim. Mas estou aqui para aprender de uma outra cultura, então devo respeitar isso né?

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Obama, O Cara


O dia chegou! Hoje milhões de americanos vão votar para o novo presidente dos EUA. Como eu já mandei meu voto (para Obama, claro) pelo correio e está quase garantido que ele vai ganhar, eu já estou pronta para fazer uma festa hoje a noite.

Antigamente eu pensava que seria melhor estar nos EUA para celebrar esse grande momento da história do país, mas como eu descobri recentemente, eu não vou brindar à vitoria de Obama sozinha. Há muitos brasileiros que estão torcendo para ele também, inclusive meu namorado, Alan, que o admira muito. O texto seguinte vem de uma entrevista que eu fiz com Alan ontem, na véspera da eleição.

Você viu os quadros de Obama no Shopping Barra e a propaganda dele na rua?

Eu vi. Vi a foto de Obama na rua em que eu passava. Eu vi Obama em vários lugares. Eu tenho uma camisa de Obama que ganhei como presente de meu amigo que mora nos EUA. E vesti porque ele é o cara. Quero que Obama faça tudo que Bush só estragou. Aqui no Brasil, tem muitas pessoas que amam ele. Todo mundo tá torcendo para ele. Cada passo que ele dá pra fazer palestra, a gente tá assistindo.

O que você pensa sobre Obama?

Eu sou uma pessoa brasileira. Sou negro, entendeu? E espero que Obama ganhe porque vai ser o primeiro negro ser presidente na história dos EUA. Tomara que ganhe porque vai ser bom para nós que têm pele negra e também vai ser bom para o país dos EUA que ele vai direitar tudo. Porque Bush só entrou pra fazer coisas que não era pra fazer. Bush tem uma mente de criança. E Obama, não. Ele vai ser o cara. Vai ser o homem dos EUA. E o outro, qual é o nome dele?

McCain.

McCain é somente um…Não sou racista, não. Eu sou eu, negro…Mas, McCain vai ser outro branco como Bush, que vai querer fazer guerra também como Bush fez…Por que a crise está agora nos EUA? Por causa de Bush porque ele não pensou antes como entrou na presidência. Se ele pensasse, não fazia nada disso.

O que é que você já ouviu falado sobre Obama na TV e no rádio?


Ouvi que ele tá na frente de McCain e que todo mundo tá torcendo pra ele. Nós brasileiros negros, a gente que trabalha nos lugares mais fracos do país—como garçom, como varredor da rua—a gente precisa superar mais. A gente tá rezando pra Obama ganhar porque, para nós, ele vai ser o exemplo da nossa vida como Nelson Mandela, que combateu a discriminação na África do Sul. A gente aqui tá esperando a oportunidade de ser alguém na vida, porque a gente ainda não tem toda nossa liberdade. Então, eu acho assim, não é só pra mim, que sou negro, mas para todas as pessoas que vivem no planeta, que têm pele negra, vai ser feliz que ele ganhar. Um presidente negro vai ver como as pessoas negras estão sofrendo. Porque agora não têm um presidente que vai lá e cuide das pessoas. Teve agora a situação em Nova Orleans—a Katarina—e Bush nem ligou direito para lá, que lá só tem pessoas negras.

Mas tem pessoas pobres e brancos também.


Eu vi na televisão. Eu sou assistador brasileiro e eu vi. Então fosse que Obama estivesse no lugar, como negro ele já tava direitando tudo lá.

Se Obama for eleito o que é que vai acontecer?

Eu espero que Obama seja um cara com carácter, que ajude as pessoas. Também tem que cumprir as coisas que ele falou antes da eleição. Tem que juntar o negro com o branco. Têm que ser a mesma coisa, que a gente é humano. A gente só tem uma pele só. Você tem uma orelha. Eu tenho um nariz…Mas eu espero que ele ganhe não só porque eu sou negro, é porque ele tem inteligência na cabeça. Vai ser a evolução do mundo. Obama vai ser o presidente que vai iluminar o mundo. Ele vai ser o melhor cara que vai ter. Bill Clinton é bom. George Bush é uma merda. Se ele fosse um presidente bom, não fazia as coisas que fez. Eu espero que Obama entre e tire a guerra do Iraque, e traga as tropas para os EUA porque lá é o país deles [os iraqis] não é o país dos EUA…Mas, Obama também pode ser um negro que não pode fazer nada. Posso falar e fazer nada. Não falei que Obama é o rei. Eu só espero que ele seja um cara que respeite todo mundo—branco, negro, azul, vermelho. Não importa a cor.

Essa é a primeira vez que os brasileiros torceram tanto para um presidente de fora?


Sim, é a primeira vez. É porque ele é negro. Não é racismo, não. É porque ele é o primeiro negro dos EUA...Eu quero que Obama ganhe pra tirar toda essa discriminação do Brasil. O branco correndo é barão; o negro correndo é ladrão. Quando você vai na discoteca que só tem brancos, aquele [funcionário] branco vai dar atenção a você, mas vai dar atenção mais ao branco e você fica no lado. Eu não sou racista. Somente tou falando a realidade.

Você acha que, um dia, o Brasil vai ter um presidente negro?


A gente espera que um dia vai ter um negro para resolver nossos problemas. Espero que um dia a gente esteja no bar ou no shopping, e um branco sorria pra gente, ou que os brancos tratem bem e respeitem as empregadas negras. Eu quero tudo isso pra minha vida—ter um presidente maravilhoso como Obama. Eu creio que ele vai ganhar. E creio que, nas próximas eleições, um negro vai ganhar de novo.

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

parabéns, coisa gostosa!

Meu aniversário foi ontem. Fiz vinte um anos. Agora, sou de idade para beber em qualquer país do mundo (os EUA inclusive!).

Eu gosto de me vestir bem no meu aniversário, de me maquiar meu rosto com um pouco mais carinho, de escolher as minhas roupas. Quero me sentir linda no dia que envelheco. É um fato incontestável que mulheres, no geral, gostem de se arrumar, e acho que aniversários são nossos dias de exibição.

De qualquer modo acho que podemos concordar que quando uma mulher se veste no seu aniversário, ela não pensa em parecer pior que o normal.

Mas, aqui em Salvador, me encontrei pensando assim. Ou seja, eu queria parecer numa maneira que, por um dia do meu intervalo no Brasil, eu podia passar sem atraer atenção na rua. OU talvez seja melhor dizer "sem um alto-índice de atenção". (Eu sei o que são metas inatingíveis).

Vocês devem estar pensando que sou uma maluca. Já estabilizamos que mulheres gostam de se vestir bem, particularmente nas suas aniversárias. Por que, então, eu estaria dizendo que pensei só em me vestir mal?

Não sei quantos de vocês, meus prezados leitores, são mulheres, nem sei quantos de vocês moram na Bahia. Aliás, vou andar por frente pesando que você, portanto, não seja uma mulher baiana. Sendo assim, você não conheceria os rapazes das ruas de Salvador.

São os piores.

Não quero dizer que esses rapazes da rua não são homens respeitáveis nos seus empregos e casas. Mas quando eles chegam na rua, se tornam outras coisas.

Se eu fosse homem ou se fosse velha, essa entrada no blog não existiria. Não sou velha, nem homem. Sou uma jovem estrangeira que gosta de andar em vez de pegar ónibus e que gosta de usar roupa que me ajuda ficar confortável. Eu nego de usar calça jeans nesse calor infernal de Salvador!

E quando eu ando pelas ruas, recebo olhadas, recebo comentários. Segundo meu público, sou uma princesa, uma coisa linda, gostosa, Amazona, delícia. Carros param. Tenho medo de que eu vá ser a causa de um acidente de trânsito. (Hoje um rapaz quase atropelou um pedestre com o seu carro porque a cabeça dele estava fora da janela para ver-me melhor.)

Vou admitir, que a primeira vez que aconteceu, foi legal. Mas dias depois de dias de homens, de qualquer estação da vida e da sociedade, me chamando; fica cansativa. A verdade é que sou uma mulher - NORMAL! - que está de saco cheio disso. Chega disto rapazes!

No meu aniversário, meu dia especial, me vesti com carinho, com o desafio de, por um dia, evitar a atenção. Usei minhas bermudas mais feias e uma camisa grossa e grande. Não pintei minha cara; usei os meus óculos. Botei meu cabelo sujo pra cima. E saí de casa...

Os comentários pararam? Não. Nunca vão parar. Mas eu sabia que tinha tentado. E era bastante.

até logo minha gente,

lisa

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

A última menina

Sou Paola, a quarta aluna do professor Alex.
Eu também sou professora, italiana e professora de Italiano. Moro em Salvador, na Barra e, faz dois anos, cheguei para dar aulas na UFBA como professora de língua nativa.
Gosto muito de viver e trabalhar na Bahia e por isso quero aprender a língua brasileira: quero comunicar me bem com as minhas alunas e com todos os baiano, porque me sinto muito a gosto com a cultura e a forma que eles têm de viver.
Eles trabalham muito (não é verdadeiro o preconceito habitual), mas no mesmo tempo vivem con entusiasmo e alegria, curtindo todas as atividades culturais, seja música ou teatro ou cinema ou palestras.
E, a propósito de palestras, na última sexta feira o departamento de Italiano organizou o seminário: "As praças da Itália", sobre a importância das praças como lugar de comunicação e de encontro.
A cultura baiana também valoriza muito a comunicação livre, fora de casa.
Os baianos falam muito y alto, como os italianos, mas eu acho que são menos agressivos , porque a polêmica resulta ser menos dura.
Por exemplo, nestas últimas eleções, eu não ouvi nehuma briga: as pessoas iam com os símbolos do seus candidatos ou cantando cançoes de propaganda, mas sem brigar.
Na Itália não seria possivel sem desencadear acusações recíprocas de comunismo ou de fascismo.
Em conclusão, inclusive por isso, é melhor viver aqui.
E vocês, o que é que acham? Onde a vida è melhor?
Ciao!
Paola